Espondilite anquilosante e isenção Imposto de Renda

Quem tem espondilite anquilosante tem direito à isenção de Imposto de Renda sobre os proventos de aposentadoria, reforma ou pensão (inclusive complementações), porque a lei que trata da isenção lista a “espondiloartrose anquilosante” como moléstia grave. Na prática, a Receita Federal e os tribunais reconhecem que “espondilite anquilosante” e “espondiloartrose anquilosante” se referem ao mesmo quadro clínico para fins tributários. A isenção não alcança salários de quem ainda está na ativa nem outros rendimentos – como aluguéis, aplicações financeiras e atividade empresarial. O início do direito, em regra, retroage à data do diagnóstico/constatação médica, e é possível pedir restituição dos últimos 5 anos. A seguir, explico passo a passo como comprovar o direito, quais rendimentos ficam isentos e quais não, como pedir administrativamente na fonte pagadora (INSS, RPPS ou entidade de previdência complementar), como retificar declarações, recuperar valores e quais são os pontos de atenção mais comuns.

O que a lei considera e por que a espondilite dá isenção

A isenção de IR para portadores de moléstia grave decorre de norma legal que lista, entre outras, a “espondiloartrose anquilosante”. O termo médico em prontuários e laudos costuma ser “espondilite anquilosante” (CID M45), de natureza inflamatória crônica. O direito é reconhecido porque, do ponto de vista tributário, trata-se do mesmo espectro patológico. A finalidade da isenção é dupla: aliviar o ônus tributário de quem tem doença grave e evitar que o custo recorrente de tratamento e acompanhamento médico reduza de forma desproporcional a renda de aposentados e pensionistas.

Quem tem direito exatamente

Têm direito à isenção os contribuintes com espondilite anquilosante que recebam:

  1. Proventos de aposentadoria do Regime Geral (INSS) ou de Regimes Próprios (servidores).

  2. Proventos de reforma (militares).

  3. Pensões (pensionistas de segurados falecidos).

  4. Complementações de aposentadoria/pensão pagas por entidades de previdência privada (fechada ou aberta), quando caracterizadas como complementação de benefício previdenciário.

Não têm direito à isenção, por essa causa, os rendimentos que não são proventos de aposentadoria, reforma ou pensão, como salários de quem ainda trabalha, pró-labore, aluguéis, lucros de empresa (salvo regras próprias), rendimentos de aplicações financeiras, prêmios e honorários de profissionais autônomos. Nada impede que, além da isenção aqui tratada, o contribuinte tenha outras hipóteses específicas de isenção – mas serão bases legais diversas.

Aposentado que adoeceu depois da aposentadoria: vale do mesmo jeito

Mesmo que o diagnóstico da espondilite anquilosante tenha ocorrido após a concessão da aposentadoria ou reforma, o direito à isenção permanece. A razão é simples: a lei condiciona a isenção à existência da moléstia grave e ao fato de os rendimentos serem proventos de aposentadoria/reforma/pensão. A data do diagnóstico pode, inclusive, definir desde quando a isenção vale e até onde é possível pedir restituição de IR pago a maior.

Precisa de laudo oficial? E se eu só tiver relatórios particulares

Para a via administrativa (na fonte pagadora), é usual a exigência de laudo emitido por serviço médico oficial (no INSS, nas juntas médicas de regimes próprios ou no serviço médico oficial da União/Estados/Municípios). Entretanto, em ação judicial não se exige, como condição absoluta, que o documento seja exclusivamente oficial: relatórios médicos particulares consistentes, exames e a própria perícia judicial podem bastar. Na prática, o caminho mais rápido é: usar laudo oficial para implantar a isenção na fonte pagadora e, se houver discussão sobre retroatividade, recorrer às vias administrativa e, se necessário, judicial.

Quais rendimentos ficam isentos e quais continuam tributados

Para tornar a distinção prática, veja a tabela abaixo.

Tipo de rendimento Fica isento pelo fato de ter espondilite anquilosante? Observações
Proventos de aposentadoria (INSS ou RPPS) Sim Isenção incide sobre a parcela tributável dos proventos
Reforma (militares) Sim Idem
Pensão por morte Sim Inclui pensões pagas por RPPS/INSS
Complementação de aposentadoria/pensão (previdência privada) Em regra, sim Reconhecida quando caracterizada como complementação do benefício
Salários de quem ainda está na ativa Não Trabalho em atividade permanece tributado
Pró-labore e honorários Não Tributação normal
Aluguéis e lucros de empresa Não Tributação normal
Rendimentos de aplicações financeiras Não Tributação normal
Indenizações por danos morais/materiais Depende da natureza Em geral, dano moral é isento por outra regra; não confundir hipóteses

Passo a passo para pedir a isenção na fonte pagadora

O pedido de isenção deve ser feito diretamente à fonte pagadora do benefício. Há três rotas usuais:

  1. Aposentados/pensionistas do INSS (RGPS)
    a) Reúna documentos pessoais, comprovante do benefício e laudo/relatório médico indicando espondilite anquilosante (CID M45), com data do diagnóstico e, se possível, menção expressa à “espondiloartrose anquilosante”.
    b) Faça o requerimento de isenção no sistema do INSS (ou presencialmente, quando for o caso).
    c) Após a análise e concessão, o INSS deixará de reter IR na fonte sobre os proventos tributáveis.
    d) Se houver IR retido indevidamente nos últimos 5 anos, você poderá buscar a restituição (veja adiante).

  2. Servidores de Regime Próprio (União/Estados/Municípios)
    a) Dirija-se ao setor de recursos humanos/previc do seu órgão.
    b) Submeta-se à junta médica oficial, se exigido, com laudos e exames.
    c) Reconhecido o direito, a isenção passa a valer na folha.
    d) Se já houve retenção indevida, utilize os mecanismos administrativos do ente e, se preciso, retifique declarações para pedir restituição.

  3. Benefícios complementares de previdência privada
    a) Peça a isenção à entidade pagadora (fundação/seguradora), apresentando laudo e documentos.
    b) Em paralelo, alinhe com a Receita Federal a forma correta de declarar esses rendimentos como isentos na sua DIRPF.
    c) Nas hipóteses em que a entidade negar, avalie a via judicial – a jurisprudência reconhece a natureza complementar dos proventos para efeitos de isenção.

Como deve ser o laudo médico para evitar retrabalho

Um bom laudo, que costuma fluir sem idas e vindas, traz:

  1. Identificação do paciente e do médico (com CRM).

  2. Diagnóstico: “espondilite anquilosante (CID M45)”, podendo constar também a expressão “espondiloartrose anquilosante”.

  3. Data do diagnóstico/primeiros sinais clínicos e histórico evolutivo.

  4. Caráter crônico e necessidade de acompanhamento permanente.

  5. Assinatura, carimbo e data.

A menção explícita à nomenclatura legal evita discussões semânticas. Como a doença é crônica, não se exige “cura” ou “período de atividade” para manter a isenção: o reconhecimento da moléstia grave basta.

Termo inicial da isenção e restituição de valores pagos

O ponto mais sensível é o “desde quando” a isenção produz efeitos. Em regra:

  1. Termo inicial: data do diagnóstico/constatação da doença, e não a data da emissão do laudo.

  2. Restituição: você pode recuperar o IR retido indevidamente limitado aos últimos 5 anos anteriores ao pedido/ajuizamento (prescrição quinquenal).

  3. Caminho prático: após implantar a isenção na fonte, retifique suas declarações de IR (DIRPF) dos últimos 5 anos, mudando a natureza dos proventos para “rendimentos isentos por moléstia grave”, e peça a restituição. Onde a retenção ocorreu na fonte (INSS, RPPS, entidade), a correção também pode ser operada administrativamente por elas.

Como declarar na DIRPF depois que a isenção for reconhecida

  1. Na ficha Rendimentos Isentos e Não Tributáveis, informe os proventos de aposentadoria/reforma/pensão como “Isenção por moléstia grave”.

  2. Se parte do ano foi tributada e a isenção iniciou no meio do exercício, faça a separação mês a mês para refletir corretamente.

  3. Complementações de aposentadoria/pensão devem seguir a mesma lógica, se enquadradas.

  4. Salários e outros rendimentos seguem declarados como tributáveis.

  5. Guarde laudos, exames e o documento de concessão da isenção por 5 anos após a entrega da declaração.

Espondilite x espondiloartrose: como lidar com a nomenclatura

Na literatura médica, “espondilite anquilosante” e “espondiloartrose anquilosante” aparecem em contextos distintos (inflamatório x degenerativo). Para fins fiscais, a administração e os tribunais acolheram a equivalência, evitando injustiça formal. Para não correr riscos:

  1. Peça que o laudo traga “espondilite anquilosante (CID M45)” e, entre parênteses, faça menção à “espondiloartrose anquilosante” como constando da lei.

  2. Se a fonte pagadora criar embaraços por terminologia, mantenha o protocolo administrativo e leve a discussão ao Judiciário com perícia médica: a natureza crônica e o enquadramento legal costumam ser reconhecidos.

Como agir se a fonte pagadora negar a isenção

  1. Peça a negativa por escrito, com os motivos.

  2. Junte laudos e exames adicionais; se o obstáculo for nomenclatura, complemente o laudo.

  3. Faça requerimento de reconsideração.

  4. Persistindo a negativa, ajuíze ação para reconhecimento do direito, com pedido de tutela de evidência/urgência quando houver risco de dano pela retenção contínua.

  5. Na mesma ação, é possível pleitear a restituição dos últimos 5 anos, com atualização.

Exemplo prático de cronograma

Imagine que Maria se aposentou em 2019 e foi diagnosticada com espondilite anquilosante em março de 2022, embora só tenha obtido laudo em fevereiro de 2023. Em julho de 2023, pediu a isenção ao INSS, que concedeu.

  1. Termo inicial: março de 2022 (diagnóstico).

  2. Restituição possível: IR retido de março/2022 em diante, limitado ao quinquênio da data do pedido/ação.

  3. Procedimentos: implantar isenção na fonte, retificar DIRPF 2022 e 2023, pedir restituições correspondentes.

Pontos de atenção para não cair na malha fina

  1. Não misture rendimentos isentos com tributáveis: se você ainda trabalha, salário continua tributável.

  2. Declare corretamente complementações de previdência: se forem renda de aposentadoria complementar, aplique a isenção; se forem resgates típicos de aplicações, a análise é outra.

  3. Guarde e apresente a documentação completa em eventual intimação: laudos, decisão administrativa, comprovantes de proventos e memórias de cálculo das retificações.

  4. Se mudou de fonte pagadora (migrou de RPPS para previdência complementar), alinhe ambas para cessar a retenção e evitar recolhimentos duplicados.

Relação com outros direitos e benefícios

  1. Prioridade de tramitação: em muitos tribunais, processos de portadores de doença grave têm prioridade.

  2. Saques e coberturas: alguns planos de previdência e seguros possuem cláusulas específicas para doenças graves.

  3. Benefícios previdenciários: a espondilite não impede que você acumule, quando cabível, auxílios previdenciários por incapacidade; a isenção de IR, porém, se liga à natureza dos rendimentos (proventos), não ao benefício por incapacidade em si.

Erros frequentes e como evitar

  1. Pedir isenção sobre salário da ativa: não cabe – foque nos proventos.

  2. Laudo sem data de diagnóstico: peça a complementação; a data é essencial para a retroatividade.

  3. Laudo sem CID: inclua o CID M45.

  4. Falta de pedido à fonte pagadora: sem a implantação na folha, continuará a haver retenção indevida.

  5. Deixar passar o prazo de 5 anos para restituição: priorize as retificações e, se necessário, ajuize a ação.

Checklist do contribuinte com espondilite

  1. Obtenha laudo médico com CID M45 e data do diagnóstico.

  2. Reúna documentos do benefício (carta de concessão, contracheques).

  3. Protocole a isenção na fonte pagadora (INSS, RPPS, entidade de previdência).

  4. Implante a isenção e verifique se cessou a retenção de IR.

  5. Retifique as DIRPF dos últimos 5 anos e peça restituições cabíveis.

  6. Guarde toda a documentação por, no mínimo, 5 anos.

  7. Diante de negativa, busque via judicial com prova médica robusta.

Perguntas e respostas

Quem está trabalhando e ainda não se aposentou pode ter isenção por espondilite anquilosante?
Não por essa hipótese legal. A isenção alcança proventos de aposentadoria, reforma e pensão. Salário na ativa continua tributável.

Preciso de laudo do SUS ou do serviço médico oficial?
Administrativamente, a fonte pagadora costuma exigir laudo oficial. Em juízo, é possível reconhecer a isenção com prova médica idônea, mesmo que particular, além da perícia judicial.

Se eu me aposentei e só depois descobri a doença, perco o direito?
Não. O direito independe do momento do diagnóstico. A data do diagnóstico serve para fixar o início dos efeitos e calcular a restituição.

A isenção vale para complementação de aposentadoria da previdência privada?
Em regra, sim, quando se trata de complementação de proventos. Havendo negativa, a via judicial tem reconhecido esse direito.

Tenho de renovar o laudo todo ano para manter a isenção?
Não existe “validade anual” na lei. Como a espondilite anquilosante é crônica, o reconhecimento não depende de recidiva. A fonte pagadora pode pedir atualização documental, mas não se trata de revalidação do direito em si.

Posso recuperar o IR que paguei nos últimos anos?
Sim, limitado aos últimos 5 anos (prescrição). Depois de implantar a isenção, retifique suas declarações e peça a restituição.

Recebo pensão por morte e tenho espondilite. Posso ter isenção?
Sim, a isenção alcança pensões. Se parte da pensão for isenta e parte tributável por outro motivo, faça a separação correta na declaração.

Tenho renda de aluguel e aplicações. Ficam isentas?
Não, permanecem tributáveis. A isenção discutida aqui é sobre proventos de aposentadoria, reforma e pensão.

A fonte pagadora negou a isenção porque meu laudo fala “espondilite”, e a lei fala “espondiloartrose”. E agora?
Peça complementação do laudo mencionando ambos os termos e, se persistir a negativa, leve a discussão ao Judiciário. A equivalência é reconhecida na prática.

A Receita pode me autuar se eu declarar como isento sem antes pedir na fonte pagadora?
Você pode declarar corretamente como isento com base na lei e na prova médica, mas o mais seguro é alinhar com a fonte pagadora para cessar a retenção e evitar inconsistências. Se cair em malha, apresente a documentação.

Conclusão

Para aposentados, reformados e pensionistas com espondilite anquilosante, a isenção de Imposto de Renda sobre os proventos é um direito concreto e plenamente exercitável. O segredo está em estruturar bem a prova médica – com CID M45, data do diagnóstico e menção à “espondiloartrose anquilosante” da lei –, protocolar o pedido na fonte pagadora e ajustar a declaração do IR para refletir a natureza isenta desses rendimentos. A isenção não se estende a salários de quem está na ativa nem a outros tipos de renda, e a restituição de valores pagos indevidamente respeita o limite de 5 anos.

Quando houver negativa por formalismo (nomenclatura, formato de laudo) ou por interpretação restritiva, a experiência mostra que a via judicial reconhece a equivalência dos termos e a finalidade protetiva da norma, dispensando exigências que não estão na lei e garantindo a retroatividade ao diagnóstico. Em poucas palavras: diagnósticos claros, documentação completa e estratégia correta transformam um direito muitas vezes desconhecido em alívio financeiro legítimo e imediato para quem convive com uma doença crônica e de alto impacto como a espondilite anquilosante.

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