BPC LOAS para famílias com baixa renda: como funciona a avaliação de renda

A avaliação de renda do BPC-LOAS, em 2025, parte do critério objetivo de renda familiar per capita igual ou inferior a ¼ do salário-mínimo; calcula-se somando os rendimentos de quem integra o grupo familiar (apenas quem vive sob o mesmo teto, nos termos legais) e dividindo pelo número de pessoas. Há hipóteses de flexibilização para até ½ salário-mínimo, a depender de fatores previstos em lei e em regulamento; o Auxílio-Inclusão não entra no cômputo; e, desde 25/06/2025, um decreto passou a prever a inclusão do Bolsa Família na renda — mudança que já é objeto de contestação judicial. A seguir, explico passo a passo como funciona o cálculo, quem conta na família, o que entra e o que fica de fora, como documentar despesas para relativizar a renda e quais estratégias usar administrativamente e em juízo.

O que, exatamente, é avaliado quando o INSS “olha a renda” no BPC

A finalidade do teste de renda é aferir vulnerabilidade econômica real do núcleo familiar do idoso (65+) ou da pessoa com deficiência (PcD) que pleiteia o BPC. O parâmetro objetivo continua a ser ¼ do salário-mínimo per capita. A lei admite, contudo, que esse limite seja ampliado, em certos casos, até ½ salário-mínimo, com base em critérios que consideram impedimentos, dependência de terceiros e comprometimento do orçamento com saúde, entre outros elementos.

Quem compõe o grupo familiar para fins do BPC

No BPC não é “toda a parentada”; só entra quem mora sob o mesmo teto e se enquadra nas categorias legais. Em 2025, o governo reafirmou que o grupo familiar é formado pelo requerente (idoso ou PcD), cônjuge/companheiro, pais (ou madrasta/padrasto na ausência de um dos pais), irmãos solteiros, filhos e enteados solteiros e menores tutelados — sempre que residam no mesmo domicílio. Parentes que ajudam financeiramente, mas moram em outro endereço, não integram o grupo; a ajuda pode ser tratada como eventual e deve ser qualificada como tal na prova.

Como calcular a renda per capita na prática

  1. Liste as pessoas do grupo familiar conforme a regra acima.

  2. Some os rendimentos brutos mensais de cada integrante que “entra no cálculo” (salário, pensões, benefícios, BPC recebido por outro familiar quando couber, benefícios temporários, rendimentos informais declarados etc.).

  3. Exclua rendimentos que a lei/jurisprudência mandam desconsiderar (detalho a seguir).

  4. Divida o total pelo número de pessoas da família.

  5. Compare o resultado com ¼ do salário-mínimo vigente (e, em cenários específicos, avalie a possibilidade de relativizar até ½ com base em prova robusta).

Dica prática: mantenha uma planilha com entradas e saídas essenciais (medicação, terapias, fraldas, transporte para tratamento, aluguel e contas básicas). Esse “raio-X” do orçamento familiar é decisivo para flexibilizar o critério, quando a renda nominal passa pouco do piso mas a vulnerabilidade é evidente.

O que entra e o que pode sair do cálculo: visão geral com base legal e estratégica

A seguir, um mapa de rendimentos comumente discutidos. Observe que há três “camadas”: regra legal/regulamentar, exceções expressas e tese/jurisprudência (úteis no recurso ao CRPS ou em ação judicial).

Item de renda Entra no cálculo? Observações
Salários (carteira, temporário, comissões) e bicos declarados Sim Regra geral: compõem a renda bruta familiar.
Benefícios previdenciários acima de 1 SM Em regra sim, ao menos a parcela que excede 1 SM pode entrar É possível pleitear desconsiderar 1 SM por isonomia com o Estatuto do Idoso e precedentes dos Tribunais Superiores.
Benefícios previdenciários de 1 SM recebidos por idoso do grupo Em regra não Os tribunais superiores estenderam a exclusão de 1 SM do idoso do cômputo, e o próprio INSS reconheceu essa orientação.
BPC recebido por outro membro (idoso/PcD) Em regra não A exclusão do BPC de 1 SM do cômputo foi reconhecida em jurisprudência consolidada.
Auxílio-Inclusão (PcD que ingressa no mercado formal) Não entra A lei é expressa ao excluir o Auxílio-Inclusão do cálculo da renda familiar.
Programas de transferência de renda (ex.: Bolsa Família) Controvérsia em 2025 O Decreto 12.534/2025 passou a incluir o Bolsa Família no cálculo, mas há decisões judiciais afastando essa inclusão.
Pensões alimentícias Em regra sim Computadas quando estáveis e recorrentes; ajudas eventuais devem ser qualificadas como tal.
Rendas indenizatórias/eventuais (indenização, doações esporádicas) Em geral não Podem ser afastadas por não traduzirem capacidade econômica contínua.
Rendimentos de MEI/conta própria Sim, se houver receita O que importa é renda efetiva; MEI sem faturamento deve ser provado.

O limite de ¼ do salário-mínimo e a possibilidade de flexibilização até ½

A LOAS fixou ¼ do salário-mínimo per capita como critério objetivo para caracterizar a necessidade econômica. A legislação mais recente autoriza, por regulamento, a ampliação até ½ salário-mínimo em determinadas situações, levando em conta o grau do impedimento, a dependência de terceiros e o comprometimento do orçamento com saúde e cuidados. Isso atende ao histórico entendimento dos tribunais de que o ¼ não é uma “muralha”, mas um indicador a ser lido junto com as circunstâncias.

Como usar essa flexibilização na prática:

  1. Quantifique gastos essenciais recorrentes (medicamentos, terapias, insumos) e demonstre que “consomem” a renda.

  2. Vincule o diagnóstico às limitações funcionais e à necessidade de terceiros.

  3. Mostre as barreiras ambientais (acessibilidade, transporte, distância) que agravam a restrição de participação.

  4. Argumente a escalada até ½ com base nos fatores legais, sempre com documentação.

A polêmica de 2025: Bolsa Família entra ou não entra na renda do BPC?

Em 25 de junho de 2025, o Decreto n.º 12.534/2025 alterou a regulamentação do BPC e passou a prever que o valor do Bolsa Família integra a renda familiar per capita para fins do BPC. A mudança é sensível porque, em muitos lares, o Bolsa Família fazia diferença para que a família permanecesse abaixo do ¼ do salário-mínimo. Em poucos meses, surgiram decisões judiciais afastando essa inclusão sob o argumento de que decreto não pode criar restrição não prevista em lei e de que programas assistenciais não deveriam ser usados para “desassistir” outra política pública voltada à extrema pobreza. Ou seja: a regra administrativa mudou, mas o tema está judicializado, e a solução pode variar de região para região até consolidar entendimento.

Estratégia:
a) Administrativamente, junte prova robusta de vulnerabilidade e, se a renda “estoura” por causa do Bolsa Família, demonstre que, sem o programa, a família não consegue custear saúde básica;
b) Judicialmente, sustente a ilegalidade da inclusão por ausência de lei e invoque precedentes que preservam a finalidade protetiva do BPC.

Passo a passo para montar o dossiê de renda de forma convincente

  1. CadÚnico atualizado: leve ao CRAS comprovantes de renda e composição familiar; mantenha o cadastro atualizado sempre que houver mudanças.

  2. Composição familiar: declare apenas quem mora sob o mesmo teto, conforme a regra legal.

  3. Entradas mensais: salário, pensão, benefícios, rendimentos de MEI, doações recorrentes.

  4. Saídas essenciais: medicamentos contínuos, terapias, fraldas, alimentação especial, transporte para tratamento, aluguel e contas básicas.

  5. Provas de exceção: se houver idoso com benefício de 1 SM ou BPC no grupo, destaque a exclusão com base na jurisprudência; se houver Auxílio-Inclusão, informe que não entra.

  6. Organização: crie índice, numere páginas e anexe tudo em ordem lógica; isso facilita a análise social e pericial.

Simulações de cálculo: do “papel” à realidade

Cenário A: família com 4 pessoas, um salário de 1,5 SM, uma pensão de ½ SM, nenhum gasto de saúde significativo. Renda per capita aproxima-se do limite e, sem gastos essenciais relevantes, a chance de flexibilização é menor.

Cenário B: família com 4 pessoas, um idoso que recebe 1 SM de benefício e outro membro PcD requerendo o BPC; gastos mensais com medicações e terapias. Estratégia: excluir 1 SM do idoso do cômputo (jurisprudência consolidada), demonstrar que as despesas essenciais “consomem” a renda restante e pleitear a flexibilização até ½.

Cenário C: família com 3 pessoas, renda formal que colocaria a per capita um pouco acima de ¼, mas com fraldas, alimentação enteral e transporte semanal para terapias. Estratégia: planilha de gastos essencialmente médicos, relatórios multiprofissionais e pedido de relativização do critério.

Cenário D: família com 5 pessoas, renda baixa, PcD requerendo BPC, recebendo Bolsa Família. Pela regra administrativa de 2025, o Bolsa Família entraria e a per capita sobe; no recurso ou ação, sustente a finalidade das políticas assistenciais e a impossibilidade de decreto restringir direito sem lei, pedindo desconsideração judicial do programa para o cômputo.

Documentação que “vira o jogo” na análise de renda

Relatórios médicos circunstanciados (com diagnóstico, evolução, limitações funcionais e necessidade de terceiros), declarações do CRAS e comprovação minuciosa de despesas de saúde têm alto peso. Em crianças, agregue relatórios pedagógicos; em adultos, descreva o impacto em atividades de vida diária e trabalho. A robustez probatória é essencial tanto para relativizar a renda quanto para afastar rendas que não deveriam compor o cômputo.

O papel do Auxílio-Inclusão na dinâmica de renda do BPC

O Auxílio-Inclusão foi criado para incentivar a PcD a trabalhar com carteira assinada: ele pode ser recebido em conjunto com o salário e não entra no cálculo da renda per capita do BPC, o que evita punir a volta ao mercado formal e viabiliza, se necessário, a reativação do BPC quando o vínculo termina. Esse detalhe é crucial ao montar cenários de renda temporariamente mais altos.

Jurisprudência e precedentes úteis para discutir renda

Além da flexibilização do ¼ — historicamente acolhida pelos tribunais —, a exclusão de 1 salário-mínimo de benefício de idoso ou assistencial do cômputo foi estendida ao caso do PcD e divulgada pelo próprio INSS em 2021; permanece útil em 2025 para recursos e ações. Use modelos de petição com esses fundamentos e sempre relacione números com fatos (gastos, acessibilidade, necessidade de terceiros).

Checklist rápido para a avaliação de renda dar certo

Identificação do grupo familiar no mesmo teto, conforme regra legal.
CadÚnico atualizado.
Comprovantes de todas as entradas e saídas essenciais.
Relatórios médicos e sociais que traduzam o diagnóstico em limitações e custos recorrentes.
Provas e argumentos para excluir rendas indevidas do cômputo (1 SM do idoso/BPC; Auxílio-Inclusão; rendas eventuais).
Plano argumentativo caso o Bolsa Família tenha sido incluído na renda administrativamente em 2025.

Erros comuns que derrubam pedidos e como evitá-los

Incluir parente que não mora com a família no grupo familiar.
Esquecer de qualificar ajudas como eventuais, fazendo-as parecer renda estável.
Não guardar notas e recibos de gastos médicos e de cuidado.
Ignorar a possibilidade de flexibilizar até ½ com base na prova; muitos recursos falham por não traduzirem as despesas doentes em números.
Deixar de invocar a exclusão do 1 SM do idoso ou assistencial no cômputo.

Como apresentar as razões de recurso ao CRPS quando o problema é renda

  1. Especifique o erro: “A análise computou o benefício assistencial de 1 SM do avô, o que não deve ocorrer, conforme orientação consolidada.”

  2. Mostre a matemática: antes e depois da exclusão ou relativização.

  3. Traduza a realidade: “Gastos mensais com medicações e terapias totalizam R$ X, documentados nas páginas Y-Z; sem eles, há risco de regressão funcional.”

  4. Peça, subsidiariamente, reabertura de instrução com nova avaliação social para verificar in loco a vulnerabilidade.

  5. Se o indeferimento se baseou em Bolsa Família na renda em 2025, destaque a controvérsia e sinalize a disposição de judicializar caso o CRPS mantenha o entendimento administrativo.

Modelo comentado de planilha de renda e despesas essenciais

Monte colunas para: Integrante, Renda bruta (mês de referência), Observações (por ex., “benefício de 1 SM de idoso – pedido de exclusão”), Despesas médicas/insumos (comprovadas), Despesas de moradia (aluguel/contas). Ao final, renda per capita nominal e renda per capita disponível após despesas essenciais, para fundamentar a flexibilização até ½.

Estudos de caso ilustrativos

Caso 1 — Exclusão de 1 SM: núcleo com idosa que recebe 1 SM de aposentadoria e neta PcD requerente. A renda per capita “no papel” supera ¼; excluindo 1 SM da idosa e demonstrando despesas de terapias e fraldas, o CRPS reconhece a vulnerabilidade.

Caso 2 — Bolsa Família e judicialização: núcleo com PcD requerente, renda formal baixa e Bolsa Família. Administrativamente, a inclusão do programa elevou a per capita; em juízo, fundamentando a impossibilidade de decreto restringir direito não previsto em lei, a sentença afastou o Bolsa Família do cômputo e concedeu o BPC.

Caso 3 — Relativização até ½: família com filho autista, renda per capita nominal em torno de 0,35 SM, mas com gastos mensais altos em terapias; a planilha documental e relatórios multiprofissionais convenceram a Junta de Recursos a aplicar a flexibilização e conceder o benefício.

Perguntas e respostas

O limite de renda do BPC é sempre ¼ do salário-mínimo?
Esse é o critério objetivo inicial. Porém a lei admite ampliação até ½ em situações justificadas, e os tribunais já reconheciam que o ¼ é um indicador, não barreira absoluta. O segredo é provar a vulnerabilidade com números e documentos.

Quem entra no grupo familiar para o cálculo?
Somente quem mora sob o mesmo teto e se enquadra nas categorias legais: cônjuge/companheiro, pais (ou madrasta/padrasto), irmãos solteiros, filhos/enteados solteiros e menores tutelados, além do próprio requerente.

O Auxílio-Inclusão conta como renda?
Não. A lei foi expressa ao excluir o Auxílio-Inclusão do cálculo da renda familiar.

Benefício de 1 salário-mínimo recebido por idoso do grupo deve ser somado?
Em regra, não. A jurisprudência superior consolidou a exclusão de 1 SM de idoso ou assistencial do cômputo — tese que também se estende ao pedido de PcD.

O Bolsa Família entra no cálculo do BPC?
Em 2025, administrativamente, sim, por força do Decreto 12.534/2025. Porém já existem decisões afastando essa inclusão por ilegalidade. Se o indeferimento se baseou nisso, vale discutir no recurso e, principalmente, judicializar quando necessário.

Posso “descontar” despesas médicas do cálculo?
Não há “desconto automático” na fórmula, mas essas despesas fundamentam a flexibilização do critério até ½ e reforçam a vulnerabilidade, impactando o convencimento do CRPS e do Judiciário.

Tenho MEI e zero faturamento: isso me impede?
Não por si só. O que importa é a renda efetiva. Prove a ausência ou a baixa receita com extratos, declarações e movimentação.

Recebo ajuda do irmão todo mês. Isso conta?
Se a ajuda é fixa e recorrente, tende a ser considerada como renda; se é eventual, explique a natureza e junte prova da intermitência.

Como organizar as provas para o recurso?
Separadores: identificação e CadÚnico, composição familiar, entradas, saídas essenciais (com notas), saúde (relatórios e receitas), fundamentos para exclusões (1 SM do idoso, Auxílio-Inclusão), e argumentos sobre Bolsa Família quando aplicável.

Conclusão

Para famílias de baixa renda, entender a avaliação de renda do BPC-LOAS é meio caminho andado rumo à concessão. A regra começa com ¼ do salário-mínimo por pessoa, mas não termina aí: a lei permite flexibilizar até ½ com prova robusta; o Auxílio-Inclusão não integra o cômputo; e a inclusão do Bolsa Família pelo Decreto 12.534/2025 está sob análise judicial, abrindo espaço para estratégias administrativas e judiciais. O cálculo exige precisão na composição familiar, transparência nas entradas, riqueza de detalhes nas despesas essenciais e domínio das exclusões admitidas por lei e jurisprudência. Com uma planilha bem montada, documentos bem organizados e argumentação técnica — conectando números à realidade social —, a família transforma a aritmética fria em prova de vulnerabilidade, elevando muito as chances de êxito no CRPS e no Judiciário. Em síntese: renda se calcula no papel, mas se decide com fatos.

Você também pode gostar disso