“CID de doença ocupacional” não é um único código, e sim o uso adequado da Classificação Estatística Internacional de Doenças (CID-10 ou CID-11) para identificar agravos à saúde cujo nexo tem relação direta com o trabalho. Em termos práticos, o médico registra o diagnóstico principal (por exemplo, J60–J70 para pneumoconioses e outras doenças respiratórias por poeiras e agentes químicos, L23–L25 para dermatites de contato, M70/M77/G56 para LER/DORT, F43 para transtornos relacionados ao estresse) e pode acrescentar marcadores que contextualizam a origem ocupacional, como Y96 (fator relacionado ao trabalho) e Z57 (exposição ocupacional a fatores de risco). No campo jurídico-previdenciário e trabalhista, a forma correta de apontar CID, aliada a provas técnicas (CAT, LTCAT, PPP, PCMSO, prontuário, laudos periciais), influencia reconhecimento de nexo causal (NTEP e nexo técnico profissional/individual), concessão de benefícios, estabilidade acidentária, adicional de insalubridade e responsabilidade civil. A seguir, explico passo a passo como os CIDs mais frequentes se aplicam às doenças ocupacionais, como médicos e operadores do Direito devem utilizá-los, quais documentos sustentam o nexo, erros comuns que provocam indeferimentos, e trago uma tabela de referência prática.
O que é “CID de doença ocupacional” e por que ele importa
A CID é um sistema padronizado internacional que codifica diagnósticos, sinais, sintomas e causas externas. Doença ocupacional é todo agravo à saúde produzido ou desencadeado pelo exercício do trabalho peculiar a determinada atividade, ou adquirido em função de condições em que o trabalho se realiza. O CID não “prova” sozinho a origem ocupacional, mas identifica a natureza do agravo; já a “ocupacionalidade” se demonstra por marcadores (Y96, Z57), por documentos técnicos (CAT, LTCAT, PPP, PCMSO) e, sobretudo, por análise de nexo causal (NTEP/NExo individual). O uso correto do CID:
• dá lastro à Comunicação de Acidente de Trabalho (CAT);
• orienta o PCMSO e a vigilância em saúde;
• subsidia peritos e juízes na avaliação de causalidade;
• influencia benefícios previdenciários acidentários (com estabilidade, alíquotas e repercussões no FAP/RAT).
Como o CID aparece nos principais fluxos médico-jurídicos
Em atestados e prontuários, o médico registra um ou mais CIDs que traduzem o diagnóstico. Em documentos previdenciários e de segurança e saúde no trabalho, a informação de CID conversa com:
• CAT: precisa identificar o agravo;
• PPP e LTCAT: descrevem exposições e condições ambientais;
• PCMSO (exames admissionais, periódicos, demissionais): monitoram agravos;
• Benefícios por incapacidade e enquadramento acidentário: dependem de nexo;
• NTEP (Nexo Técnico Epidemiológico Previdenciário): correlaciona estatisticamente CNAE e CID.
A prudência clínica manda: o CID é escolhido pelo médico assistente, não pelo RH, nem pelo advogado. Informar CID em atestado exige anuência do paciente; em documentos técnicos e periciais, a codificação é usual e esperada.
Estrutura da CID aplicável ao contexto ocupacional
Na CID-10 (ainda a mais utilizada na prática brasileira), há três “camadas” relevantes:
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Capítulos que trazem diagnósticos por sistemas (ex.: doenças respiratórias, osteomusculares, pele, mentais etc.).
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Categorias Z que indicam circunstâncias influentes (ex.: Z57 “exposição ocupacional a fatores de risco”).
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Causas externas e marcadores especiais (ex.: Y96 “fator relacionado ao trabalho”).
Na CID-11, o raciocínio é semelhante, com extensões (extensions) para fatores de contexto e mecanismos, mas, no uso corrente do eSocial, CAT e benefícios, a CID-10 ainda predomina.
Faixas de CID mais frequentes em doenças ocupacionais
A seguir, os “territórios” de maior incidência ocupacional:
Doenças respiratórias por poeiras, fibras e agentes químicos
• J60–J70: pneumoconioses (J60 pneumoconiose dos mineiros de carvão, J61 por amianto, J62 por sílica, J63 outras), bronquite e bronquiolite por agentes químicos, edema pulmonar tóxico, doenças das vias aéreas por gases e vapores (J68).
• Relevância: mineração, construção civil, jateamento, lapidação, indústrias químicas.
Dermatoses ocupacionais
• L23 (dermatite de contato alérgica), L24 (dermatite de contato por irritantes), L25 (dermatite de contato não especificada), L57 (lesões actínicas por radiação solar em trabalho a céu aberto, dependendo do caso).
• Relevância: limpeza, saúde, estética, metalurgia, alimentos, agricultura.
LER/DORT e afecções osteomusculares relacionadas ao uso repetitivo e sobrecarga
• M70 (afecções de partes moles relacionadas ao uso, sobrecarga e pressão), M75 (ombro, incluindo tendinopatias), M77 (epicondilites), G56 (mononeuropatias do membro superior, como síndrome do túnel do carpo).
• Relevância: linhas de produção, call centers, logística, enfermagem, TI, comércio.
Perdas auditivas e agravos por ruído e vibração
• H90 (perdas auditivas condutiva e neurossensorial; o enquadramento específico depende da avaliação), H83 (transtornos do ouvido interno; usar com parcimônia e precisão clínica), W42 (exposição a ruído excessivo) como causa externa e Y96 para marcar relação laboral.
• Relevância: metalurgia, construção, aeroportos, entretenimento, linhas de produção.
Transtornos mentais e comportamentais relacionados ao trabalho
• F43 (reações ao estresse grave e transtornos de adaptação), F32–F33 (episódios depressivos e transtorno depressivo recorrente), F41 (transtornos ansiosos), quando contextualizados por Z56 (problemas relacionados ao emprego) e Z57 (exposição ocupacional), além de Y96 em causalidades evidentes.
• Relevância: setores com pressão extrema, violência ocupacional, assédio, jornadas extenuantes.
Intoxicações e efeitos tóxicos
• T51–T65 (efeitos tóxicos de substâncias), X49 (exposição acidental a outros produtos químicos) como causa externa, acrescido de Y96.
• Relevância: agrícolas (agrotóxicos), laboratórios, indústria química, limpeza pesada.
Transtornos por agentes físicos
• T70–T79 (efeitos de pressão, temperatura, vibração) quando couber.
• Relevância: mergulho, câmara hiperbárica, fundição, câmaras frias.
Lombalgias e afecções da coluna
• M54 (dorsalgias e lombalgias) e M51/M47 (discopatias e espondiloses) quando houver nexo técnico robusto (manuseio de cargas, posturas forçadas).
• Relevância: logística, transporte, construção.
Doenças infecciosas relacionadas ao trabalho
• B95–B97 como agentes causais associados (quando aplicável), Z20–Z29 (condições que exigem vigilância por contato/exposição), acrescido de Y96.
• Relevância: saúde, coleta de resíduos, necrotérios, laboratórios.
Marcadores que “assinam” o nexo laboral: Y96 e Z57
Dois códigos têm papel de “carimbo” ocupacional:
Y96 – Fator relacionado ao trabalho
• Usado como causa externa para assinalar que o evento/agravo ocorreu em contexto de trabalho.
• Não substitui o diagnóstico; complementa a informação clínica.
Z57 – Exposição ocupacional a fatores de risco
• Z57.0 ruído, Z57.1 vibração, Z57.2 poeira, Z57.3 radiações, Z57.4 agentes tóxicos, Z57.5 temperaturas extremas etc.
• Útil para compor o quadro de exposição no prontuário e no PCMSO.
Esses marcadores não “criam” direito automaticamente, mas fortalecem consistência documental e dialogam com perícias.
CID-10 x CID-11: devo migrar?
O Brasil caminha para CID-11, que permite extensões (codes post-coordination) para detalhar exposição, mecanismo e local. Contudo, CAT, eSocial e benefício por incapacidade ainda se baseiam majoritariamente em CID-10. Recomenda-se:
• manter coerência com CID-10 para atos oficiais atuais;
• quando possível, já estruturar prontuários com lógica compatível com CID-11 (descrição de mecanismo, exposição, local anatômico), facilitando futuras migrações.
NTEP: como o CID conversa com o CNAE para inferir nexo
O Nexo Técnico Epidemiológico Previdenciário (NTEP) cruza códigos CID com a Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE) da empresa. Se a estatística setorial indica associação significativa entre certo CID e aquela atividade, presume-se nexo. Isso:
• simplifica concessão de benefício acidentário (B91);
• pode ser afastado por prova em contrário (nexo técnico individual, multifatorialidade, vida extra-laboral);
• influencia alíquotas via FAP/RAT.
O advogado deve compreender que o NTEP cria uma presunção relativa; a empresa pode elidir, e o segurado pode robustecer com provas.
Prova técnica e documentos que cercam o CID
O CID fica mais “forte” quando cercado de documentos coerentes:
• CAT com narrativa do evento/exposição;
• LTCAT e PPP descrevendo agentes e intensidades;
• PCMSO com ASOs, exames complementares e condutas;
• Prontuários e laudos especializados (pneumo, dermato, otorrino, ortopedia, psiquiatria);
• Laudos ambientais (dosimetrias, medições);
• Treinamentos, fichas de EPI/EPC;
• Historial ocupacional (tempo de função, jornadas, pausas, rodízios).
Erros frequentes no uso do CID em doenças ocupacionais
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Substituir nexo por CID: escrever um CID “clássico” não prova causalidade sem a ponte técnico-documental.
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Usar CID inespecífico quando há diagnóstico claro: p.ex., “M54.5 lombalgia” crônica sem investigar M51/M47; prejudica o nexo.
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Omitir Y96/Z57 onde há relação evidente: enfraquece consistência do caso.
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Divergência entre CID do atestado e do prontuário: gera dúvida pericial.
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Ignorar multifatorialidade: afirmar exclusividade ocupacional quando há comorbidades relevantes pode minar credibilidade.
Tabela de referência rápida: CID e exemplos ocupacionais
Grupo CID | Diagnóstico típico | Exemplos de ocupações | Evidências-chave de nexo |
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J60–J70 | Pneumoconioses; doenças respiratórias por agentes químicos (J68) | Mineração, jateamento, construção, indústria química | LTCAT/PPP com poeiras/fibras; radiografias/TC; histórico de exposição; CAT |
L23–L25 | Dermatites de contato (alérgica/irritativa) | Limpeza, saúde, metalurgia, cosméticos, alimentos | Testes de contato; inventário de agentes (tensioativos, metais, borrachas); Z57 |
M70/M75/M77/G56 | LER/DORT (tendinites, bursites, epicondilites, túnel do carpo) | Linha de montagem, logística, enfermagem, escritórios | Ergonomia, repetitividade, força, pausa; EMG (túnel do carpo); PCMSO |
H90 (± W42, Y96) | Perda auditiva (avaliar tipo) | Metalurgia, aeroportos, construção | Audiometrias sequenciais; dosimetria de ruído; uso/efetividade de EPI |
F43/F32/F41 (± Z56, Z57) | Estresse, depressão, ansiedade | Call centers, segurança, saúde, metas agressivas | Prontuários, histórico ocupacional, eventos críticos; avaliação psicossocial |
T51–T65 (± Y96) | Intoxicações por solventes, metais, agrotóxicos | Químicas, oficinas, agricultura | Dosagens biológicas, inventário de agentes, registros de aplicação/manuseio |
M54/M47/M51 | Lombalgias, espondiloses, discopatias | Transporte, construção, logística | Levantamento de cargas; posturas; imagem; registros de tarefas |
B95–B97 (agentes), Z20–Z29 (exposição) | Infecções relacionadas ao trabalho | Saúde, coleta de resíduos, laboratórios | Exposição documentada; vigilância; PCMSO; CAT em surtos |
Como o médico deve documentar para sustentar o nexo
Boas práticas clínicas:
• Diagnóstico preciso e atualizado (evitar rótulos genéricos quando possível).
• Linha do tempo clínica x ocupacional (início dos sintomas, mudança de função, intensidade de exposição).
• Registro de tratamentos e resposta terapêutica.
• Marcação de Y96/Z57 quando o contexto laboral é determinante.
• Encaminhamentos a especialistas (otorrino, dermato, pneumo, ortopedia, psiquiatria) com laudos integrados.
Como o advogado deve ler o CID e montar a prova
Boas práticas jurídicas:
• Não litigar “pelo CID”: estruture o nexo com documentos ambientais, históricos e periciais.
• Verifique coerência entre CID do atestado, prontuários e CAT.
• Use o NTEP como ponto de partida, não de chegada; prepare-se para refutar ou robustecer.
• Em transtornos mentais, construa narrativa fática (assédio, metas abusivas, violência) e vincule-a a F43/F32/F41 com documentos e testemunhas.
• Em dermatoses, agregue inventários de produtos, fichas FISPQ e testes de contato.
Nexo técnico: profissional, epidemiológico e individual
Três “portas” de nexo:
• Profissional (lista oficial de doenças relacionadas ao trabalho): quando o agente/atividade é clássico para o agravo.
• Epidemiológico (NTEP): presunção estatística vinculada ao CNAE.
• Individual: fundamentado em história, exames, intensidade e duração da exposição, concorrência de causas.
O CID, quando “bate” com listas e NTEP, facilita; quando não bate, exige perícia mais minuciosa.
CID e eSocial: onde isso aparece
Eventos de SST no eSocial (p. ex., S-2220, S-2240) dialogam com informações de exames e exposições. Embora não se transmita o CID de forma ampla para todos os eventos, a coerência entre PCMSO (que usa CID), LTCAT/PPP e CAT precisa existir; divergências causam inconsistência que se reflete em autuações e litígios.
Saúde do trabalhador e vigilância: do caso ao coletivo
Cada CID não é apenas um “caso”, mas um sinal para o sistema de gestão de riscos:
• Muitas LER/DORT em um setor? Rever ergonomia, pausas e rodízios.
• Elevação de dermatoses? Revisar produtos, procedimentos, barreiras cutâneas.
• Picos de perda auditiva? Checar proteção coletiva, enclausuramento de fontes, treinamento real.
• Transtornos mentais? Mapear riscos psicossociais, cultura, carga de trabalho.
Estudos de caso resumidos
Caso 1 – Silicose em jateador
CID J62; Z57.2 (poeira); Y96. LTCAT/PPP confirmam exposição a sílica cristalina. RX/TC com padrão típico. NTEP favorável (CNAE construção/metalurgia). Resultado: reconhecimento de nexo, benefício acidentário, medidas corretivas e responsabilização civil discutida.
Caso 2 – Dermatite de contato em auxiliar de limpeza
CID L24/L23; Z57.4 (agentes químicos). Testes de contato positivos para quaternários de amônio. FISPQ do produto confirma irritância/sensibilização. Ajuste de luvas e troca de insumos reduzem recidivas. Nexo reconhecido.
Caso 3 – Perda auditiva em soldador
CID H90 (neurossensorial bilateral); W42/Y96. Audiometrias com curva em entalhe clássico; dosimetria > limite. EPI com baixa atenuação efetiva. Nexo reconhecido, medidas de enclausuramento e rodízio implementadas.
Caso 4 – Transtorno de adaptação por assédio reiterado
CID F43; Z56/Z57. Prontuário psiquiátrico e psicoterapia documentam temporalidade com fatos laborais (relatórios, comunicações internas). Perícia reconhece nexo; empresa condenada por dano moral e obrigação de fazer em saúde organizacional.
Questões de confidencialidade e ética no uso do CID
• Atestado médico ao empregador: CID não é obrigatório, salvo autorização expressa do paciente (exceto em contextos específicos legais).
• Documentos previdenciários/periciais: a codificação é parte do ato técnico.
• Prontuário: guarda e acesso segundo regras de sigilo médico e LGPD.
• Comunicação interna: RH deve tratar informação de saúde com mínima necessidade e máxima confidencialidade.
Como reagir a indeferimentos por “CID inadequado”
Passos práticos:
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Obter cópia integral do processo administrativo (benefício, CAT).
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Identificar o motivo: ausência de nexo, CID inespecífico, falha de documentos.
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Atualizar diagnóstico (se necessário) e complementar marcadores Y96/Z57, sem “forçar” codificação.
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Agregar LTCAT/PPP, medições, laudos clínicos e narrativas de exposição.
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Recurso administrativo ou ação judicial, com quesitos periciais que foquem causalidade, intensidade e duração.
Como escolher o CID certo: precisão clínica antes de tudo
Erguer o nexo começa pela boa clínica:
• Em LER/DORT, diferencie tendinopatia (M75) de neuropatia compressiva (G56);
• Em dermatoses, diferencie irritativa (L24) de alérgica (L23) com testes;
• Em perdas auditivas, caracterize tipo e grau (H90) e vincule à história de ruído;
• Em pneumoconioses, documente imagem e história ocupacional detalhada.
Interações com adicionais trabalhistas e estabilidade
O reconhecimento ocupacional do agravo (por CID + nexo) repercute em:
• Estabilidade acidentária (conforme espécie de afastamento e benefício);
• Adicional de insalubridade (prova de exposição e limites de tolerância);
• Dano moral/material por doença ocupacional (responsabilidade civil).
Perguntas e respostas
Existe “um” CID específico que diga “doença ocupacional”?
Não. O médico registra o diagnóstico (CID principal) e pode adicionar marcadores de contexto, como Y96 (fator relacionado ao trabalho) e Z57 (exposição ocupacional). A ocupacionalidade depende do nexo.
Qual a diferença entre usar J68 e acrescentar Y96?
J68 descreve a doença respiratória por agentes químicos; Y96 informa que o evento está relacionado ao trabalho. O primeiro é diagnóstico; o segundo é contexto.
NTEP sozinho garante benefício acidentário?
Cria presunção relativa. Pode ser afastado por prova em contrário ou fortalecido por provas técnicas. Documentos ambientais e clínicos são decisivos.
CID em atestado é obrigatório para o empregador?
Não, salvo autorização do trabalhador. Em perícias, CAT e benefícios, a codificação é usual e necessária.
M54 (lombalgia) serve para doença ocupacional?
Pode servir como ponto de partida, mas é inespecífico. Se houver base ocupacional, investigue melhor (M51, M47) e demonstre o nexo com tarefas e cargas.
Perda auditiva por ruído tem CID próprio?
A perda auditiva é classificada em H90 (completando com laudos audiométricos). O contexto laboral se indica com W42 (exposição a ruído) e Y96, além de Z57.0 para exposição a ruído.
Posso “trocar” o CID para facilitar o nexo?
Não. CID é ato médico técnico. O caminho correto é aprofundar diagnóstico e robustecer a prova de exposição e causalidade.
Transtornos mentais por assédio entram como doença ocupacional?
Podem entrar, desde que haja diagnóstico psiquiátrico (p.ex., F43) e demonstração do nexo com fatos laborais (documentos, testemunhas, histórico funcional).
Z57 é suficiente para dizer que a doença é ocupacional?
Não. Z57 indica exposição ocupacional a risco; é complementar. O nexo resulta do conjunto probatório.
CID-11 já é obrigatório?
Ainda não é a base dominante para CAT/benefícios no Brasil. A orientação prática é usar CID-10 e preparar registros que facilitem a futura transição.
Dermatite de contato ocupacional precisa de teste?
Idealmente, sim. Testes de contato (patch test) ajudam a diferenciar irritativa de alérgica e a vincular ao agente do ambiente de trabalho.
Como o advogado usa o CID em juízo?
Como peça do quebra-cabeça: ele traduz o agravo; os laudos e documentos provam exposição e causalidade. Evite centrar a tese apenas no código.
Conclusão
“CID de doença ocupacional” não é um rótulo único, mas a combinação correta entre diagnóstico clínico codificado e a comprovação técnica de que esse agravo decorre ou é agravado pelo trabalho. Na prática, o caminho sólido passa por quatro pilares:
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Diagnóstico preciso, com CID adequado ao quadro (evitar generalidades quando há especificidade possível).
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Contextualização ocupacional explícita, com Y96 e Z57 quando pertinentes, sem “forçar” codificações.
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Provas ambientais e organizacionais robustas (CAT, LTCAT, PPP, PCMSO, medições, prontuários, laudos especializados), integradas numa linha do tempo que faça sentido.
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Enquadramento jurídico-previdenciário atento ao NTEP e às hipóteses de nexo individual, lembrando que presunções são relativas e que a prova técnica de qualidade é o que decide.
Para médicos, significa registrar com precisão, relacionar sintomas e exposições, e encaminhar ao especialista quando necessário. Para advogados e operadores do Direito, significa não “litigar pelo CID”, mas usá-lo como linguagem comum entre clínica e Direito, ordenando a prova pericial e documental para demonstrar causalidade. Para empresas e profissionais de SST, significa enxergar cada CID como indicador de risco sistêmico, que pede revisões de processo, engenharia de proteção e medidas organizacionais.
Quando esses atores conversam pela mesma gramática (o CID bem usado, o nexo bem provado), a justiça material tende a prevalecer: o trabalhador doente é protegido de forma adequada, o empregador diligente tem meios de se defender e aprimorar seus ambientes, e o sistema previdenciário reconhece com mais rapidez aquilo que verdadeiramente decorre do trabalho.